Resíduos têxteis: a prática de descarte nas indústrias de confecção do vestuário

By Fashion Revolution

4 years ago

Este trabalho é de autoria de Gabriela Leite Marcondes Schott e faz parte do Fórum Fashion Revolution 2019. As inscrições para o Fórum Fashion Revolution #Digital  estão abertas até 6 de julho: não perca.

Introdução

Nesta pesquisa, discutimos como a gestão do descarte dos resíduos sólidos têxteis oriundos das indústrias de confecção do vestuário pode criar condições socialmente justas de trabalho para os catadores com a geração de renda, além de fomentar a preservação ambiental por meio de práticas adequadas para a redução do volume de resíduos têxteis destinado aos aterros sanitários. Dessa maneira, os resíduos têxteis podem ser reaproveitados, reutilizados e reciclados em vez de simplesmente descartados.

Segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT, 2013), o setor têxtil emprega cerca de 1,7 milhão de brasileiros, sendo que 75% são funcionários do segmento de confecção. Em 2012, o faturamento do setor têxtil e de confecção foi de US$ 56,7 bilhões, o que representa 6% do valor total da produção da indústria de transformação do país. O setor reúne mais de 32 mil empresas, das quais mais de 80% são confecções de pequeno e médio portes em todo o território nacional. Muitas indústrias de confecção são micro e pequenas empresas, e algumas possuem toda a estrutura do processo produtivo (modelagem, enfesto, corte, costura, arremate e acabamento).

Essas indústrias geram grande quantidade de resíduos têxteis provenientes de seus processos produtivos, o que impacta negativamente o meio ambiente. Sabe-se que esses materiais (tecidos) apresentam diferentes composições (fibras naturais, artificiais e sintéticas), além de outros materiais (plástico, metal, papel, papelão, linha), que são descartados e dispostos inadequadamente, afetando diretamente os sistemas sociais e ambientais. Os aspectos que envolvem os padrões de produção do vestuário são complexos. A questão da responsabilidade socioambiental não pode ser dissociada desse setor, sempre sujeito a mudanças. Nesse sentido, a indústria de confecção do vestuário deve seguir as recomendações da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Isso porque, os resíduos têxteis descartados de maneira correta podem se tornar matéria-prima para a própria indústria ou para outros fins, por meio da reciclagem.

Com a implementação da Lei n° 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), as indústrias de confecção do vestuário devem se adequar e mudar a gestão dos resíduos sólidos têxteis, pautados na educação, eficiência, cooperação entre os atores envolvidos e inclusão social dos catadores de materiais recicláveis, com responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida desses produtos.

Desenvolvimento

A gestão do descarte dos resíduos sólidos têxteis oriundos das indústrias de confecção do vestuário apresenta possibilidades para a mudança nas práticas sociais e econômicas. A preocupação com os impactos trazidos pelo aumento desses resíduos é intensificada pelo não reaproveitamento da maior parte desses materiais e por sua inapropriada destinação. Um dos objetivos da PNRS é estimular a adoção de padrões sustentáveis de produção, desenvolvimento de tecnologias limpas e incentivo à indústria da reciclagem. A gestão integrada dos resíduos sólidos e, principalmente, a inclusão dos catadores de materiais recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada estimulam e incentivam o desenvolvimento da gestão sustentável dos resíduos têxteis, uma vez que o resíduo têxtil é 100% reciclável.

A gestão social diz respeito à participação da sociedade, autonomia e articulação dos diversos atores sociais para
a construção de uma nova realidade que, segundo Dowbor (1999), remete à transformação da sociedade para
a construção de um novo paradigma a partir da redefinição das relações entre o político (PNRS), o econômico
(indústrias de confecção do vestuário) e o social (catadores), por meio de novas práticas que respeitem o ambiente e
os valores de sustentabilidade, como parte de um processo coletivo de corresponsabilidade.

De acordo com PNRS, Lei n°12.305/2010, em seu artigo 7°, “prioriza a gestão compartilhada e o gerenciamento de resíduos sólidos em uma ordem de prioridade que consiste em: não gerar; reduzir; reutilizar; reciclar; tratar e dispor adequadamente”. Explorar caminhos possíveis em direção à sustentabilidade é uma tendência mundial; a reciclagem e sua viabilização produzirão transformações nos processos produtivos e nas atividades humanas do setor têxtil e da moda para um futuro sustentável (PELTIER; SAPORTA, 2009).

O artigo 30, parágrafo único, da mesma lei, institui o princípio da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos (pré-produção, produção, distribuição, uso e descarte), e abrange fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, consumidores e titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos. Os objetivos da responsabilidade compartilhada são reduzir e reutilizar os resíduos gerados dentro da própria cadeia ou em outras cadeias produtivas, minimizando os impactos e os riscos ambientais, sociais e sanitários decorrentes do ciclo de vida dos produtos.

De acordo com a ABIT (2012), são produzidas no Brasil 1.100.000 toneladas de peças de vestuário, anualmente, sendo 12% de desperdícios. É preciso reconhecer que o resíduo sólido têxtil é reutilizável e reciclável com valor econômico e social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania, conforme institui o artigo 6° da Lei n° 12.305/2010. O reaproveitamento de resíduos têxteis e o descarte correto são medidas emergenciais que deverão ser aplicadas pelas indústrias de confecção do vestuário dentro do conceito de Produção Mais Limpa. A PNRS permeia a gestão socioambiental, pois estimula a adoção de padrões sustentáveis de produção, a partir do desenvolvimento de tecnologias limpas.

A indústria da moda, com todo seu avanço tecnológico em relação aos materiais inteligentes, mostra-se ainda pouco preocupada com as questões relativas à diminuição da quantidade de resíduos gerados nas suas atividades. As indústrias de confecção do vestuário devem adotar práticas para reaproveitar os resíduos têxteis provenientes dos cortes dos tecidos, reutilizando-os na elaboração de novas propostas a partir de técnicas manuais e artesanais, manipulando retalhos e explorando as aparas, além de bordados e aplicações com criatividade e design para
obtenção de aspectos decorativos nas peças, gerando produtos desejáveis e atemporais, ampliando seu valor simbólico e, consequentemente, sua durabilidade, aumentando o ciclo de vida desses produtos e valorizando as práticas sustentáveis dentro da cadeia produtiva.

Esses são alguns recursos que implicam menos consumo de matéria-prima e maior reaproveitamento de resíduos têxteis com menor volume para a disposição final. Um modelo de produção dentro do desenvolvimento e utilização de tecnologias limpas.

Reflexões

Grande parte dos produtos de moda que estão nos mercados nacional e internacional são reflexos da indústria convencional, cuja produção é globalizada e na qual predominam produtos de baixa qualidade. É preciso uma ruptura nesse modelo vigente, investindo em qualidade, durabilidade e design. A produção deve estar sintonizada com a noção contemporânea de sustentabilidade, e o designer deve ser capaz de influenciar e solucionar as demandas, incorporando técnicas e novas tecnologias.

A PNRS propõe a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, a logística reversa, a reutilização e a reciclagem, fortalecendo os princípios da gestão compartilhada, com compromisso e consciência individual e coletiva sobre as escolhas perante a sociedade. Dessa forma, caminha-se para a construção de um futuro desejável, gerenciando os resíduos sólidos têxteis, gerados pelas indústrias de confecção do vestuário por meio de novos incentivos e parcerias que favoreçam práticas de gestão socioambiental, além de compartilhar responsabilidades, permitindo maior sinergia entre os atores sociais (poder público, indústria de confecção, associação de catadores de matérias recicláveis, indústrias recicladoras), com inclusão socioeconômica desses atores no sistema de coleta seletiva.

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