A moda só será sustentável se for diversa

By Fashion Revolution

4 years ago

A moda como conhecemos hoje ainda é alheia à diversidade de corpos. Quase 1/4 da população brasileira possui alguma deficiência (IBGE 2010), mas ouvimos relatos de PcD’s com dificuldades para comprar itens de vestuário, o que revela uma indústria padronizada que normaliza apenas alguns biótipos.

Conversamos com mulheres com deficiência sobre como elas vêem a diversidade na moda hoje e o que acreditam que deve ser transformado rumo a diversidade e empatia. Sara, Mylena, Stephanie e Rafaela  compartilham suas experiências e visões de mundo, juntamente com Grace que é costureira de moda inclusiva.

Sara Suelo

“A moda necessita ser acessível para todos, para todas as culturas com o maior objetivo de criar novas ideias, visando a empatia, respeito e união. Podemos unir e estimular essas novas ideias para realizar uma moda mais diversificada. Infelizmente a moda não é tão presente na comunidade surda, na maioria das vezes não participamos como protagonistas no mundo da moda, mas sempre nos bastidores dos bastidores. Assim como os ouvintes temos a habilidade de criar e contribuir com nossas ideias.

A maior dificuldade que encontramos seja em qualquer área, seja na moda ou até mesmo em escolas, sempre nos é negado a oportunidade devido a nossa deficiência, mas assim como todas as pessoas temos sonhos. E o fato de termos uma deficiência isso não nos torna menos capazes que os outros, pois temos a capacidade e experiências para exercer uma função dentro do mundo da moda. Percebo que na maioria das empresas falta igualdade, sempre colocando os ouvintes num patamar mais avançado que o nosso. Precisamos nos sentir valorizados e aceitos como a maioria. Que um dia haja uma acessibilidade verdadeira, e que o mundo aceite profissionais surdos. Que a união seja nosso lema!”

Mylena Rodrigues

“Sou pessoa com deficiência visual, e um dos maiores desafios em relação a moda para quem tem deficiência visual e baixa visão com certeza é saber as informações das peças de roupa, como por exemplo cor da roupa e tamanho; enxergar as etiquetas é muito complicado – mesmo que tenha o braile. O braile nem toda pessoa com deficiência visual lê. Então uma das alternativas que venho trazendo quando o assunto é moda inclusiva é a alternativa do QR Code, com uma descrição rápida, simples e objetiva da peça de roupa.

Eu penso que a diversidade na moda hoje é muito grande e as possibilidades são amplas. Venho percebendo que cada vez mais se fala em acessibilidade e inclusão, principalmente pensando em pessoas com deficiência, e também tirando um pouco dos padrões, pensando na pluralidade. E isso para mim é muito bom e fundamental, para que tenhamos cada vez mais roupas e sapatos, toda a moda envolvida nisso e buscando uma diversidade e as possibilidades para a inclusão e acessibilidade de todos.”

Stephanie Marques

“Eu indico duas pequenas mudanças que farão uma grande diferença enorme na vida de muitos PcD’s: primeiro, roupas com zíper estratégico, já que facilitarão o processo de colocar e retirar do corpo, além de se adaptar ao uso de próteses e cadeira de rodas. Segundo: roupas que atendam ao público adulto, porém de baixa estatura, sejam pessoas com nanismo, displasia ou qualquer outra deficiência que tenha como característica altura reduzida. 

Para criarmos uma moda mais diversa, acessível e empática, basta que as marcas tenham interesse de ouvir o público em questão. Nada melhor do que nós, pessoas com deficiência, para dizer quais são nossas maiores dificuldades para tentar acessar o mercado da moda. Nós somos consumidores e também temos direito a acessibilidade neste mercado em questão.”

Rafaela Teixeira

Precisamos de “dedicação e representação prática, trazer pessoas que realmente possam acrescentar e parcerias acessíveis para desenvolver peças e modelagens que possam ser realmente fabricadas. Acredito que poderia ser obrigatório toda marca ter pelo menos uma ou mais coleções por ano que sejam acessíveis, sustentáveis e inclusivas dentro da diversidade da moda.

As maiores dificuldades estão na falta de acessibilidade da roupa, a modelagem pensada em corpos tradicionais, membros completos, visibilidade ativa e aviamentos em locais não acessíveis. O mercado da moda necessita estar atento na prática para atender a todos os tipos de necessidades na inclusão de uma pessoa, a empatia precisa estar no processo de desenvolvimento do produto, antes mesmo de ser projetado é preciso saber para quem será desenvolvido, buscando a melhor maneira de priorizar a sustentabilidade e a inclusão que a marca vai desenvolver.”

Grace Santos

“Eu comecei a trabalhar com a moda inclusiva em 2017. Aprendi a costurar montando roupa de grandes marcas junto com uma amiga, e enquanto a gente aprendia a costurar essas roupas, fomos aprimorando o assunto da inclusão, que sempre foi nosso foco. […] Então a gente conversava com nosso público para entender as necessidades deles – e não são difíceis de entender. É super possível fazer e criar uma demanda. […] Agora em 2020 a gente se viu na pandemia, e procuramos saber da comunidade surda quais eram as necessidades: a leitura labial. No início, costurávamos para as pessoas surdas, mas hoje atendemos mais aos ouvintes, o que é muito bacana, porque as pessoas estão entendendo que quem faz a leitura labial é o surdo, e os ouvintes que precisam ter a máscara para oferecer a leitura.”